A ESTAÇÃO: Quando o ramal
de Santa Veridiana foi projetado, a estação de Santa Silvéria
não constava dos planos. Aí, durante a construção da linha, o fazendeiro
José Júlio de Araújo Macedo pediu e obteve permissão para construir,
em terras de sua propriedade, uma estação e um armazém, de acordo
com projetos que lhe foram fornecidos pela Paulista, e que deveriam
se localizar aproximadamente à eqüidistância das estações de Baguassu
e Palmeiras.
Ela foi inaugurada em 1892 (veja caixa abaixo, de 1892) no mesmo dia da estação
seguinte, de Palmeiras, e com grande movimento, em 1895 teve
seu armazém ampliado.
Foi por muitos anos a estação de maior movimento
em termos de embarque de café no município de Santa Cruz das Palmeiras.
"A gente voltava da Escola Normal, em
Pirassununga, nos anos 1950, com o trem misto, no final da
tarde. Quando ele carregava muita carga, não conseguia subir a rampa
entre Baguassu e Santa Silvéria, então ele deixava o único vagão de
passageiros em baixo, subia com parte da carga e depois voltava de
ré para buscar o resto..." (Luiz Affonso Mendes, o Dudízio, Santa
Cruz das Palmeiras, 1999).
"Eu e meu pai íamos de bicicleta
até Santa Silvéria, colocávamo-las no trem e vínhamos até Palmeiras...
Como posso me esquecer disso? Justamente agora que a lembrança do pai
aperta nessas horas..." (Luiz Affonso Mendes Junior, o
Ju, Santa Cruz das Palmeiras, 2004).
"Não me lembro bem,
mas acho que foi em 1967, minha mãe confirmou. Vinhamos de Pirassununga
e o trem, com destino a Palmeiras, parava em Santa Silvéria. No carro,
gente de Palmeiras, minha mãe Wercy, minha avó Irene, a prima Ivete,
mais dois senhores de uma fazenda nos arredores da cidade que não
me lembro mais quem eram, duas ou três senhoras da Catequese e o Padre
Ézio, pároco de Santa Cruz naquela época. Tardezinha ensolarada, o
trem parou em Santa Silvéria por poucos minutos apenas. Pusemos
a cabeça pra fora da janelinha, e, num suspiro, chamei tão alto minha
mãe, que todos os presentes acabaram despertando atenção para
meu chamado: - Mãe, olha só! Referia-me à roça de milho à
esquerda. Amarelinhos, todos ali com fome, o imaginário dos
presentes eram um só: aquelas espigas na panela,
aquele milho cozido com sal, água na boca. Apesar do pouco
tempo que o trem dispunha até sua partida, daria tempo pra
fazer dar uma investida na roça, mas, e a presença do padre? Todos pensaram, creio,
a mesma coisa: Ah, se o padre Ézio não estivesse aqui conosco,
a gente levaria metade dessa roça de milho pra Palmeiras. Tivemos
que tirar esse desejo da mente (do estômago, melhor dizendo). com
o Padre ali, ainda mais acompanhado pelas beatas. Uma pena. Voltamos
ao duro acento do trem e esperamos o apito pra partir. Todos quietos,
pensativos. O trem apita. O som daquela locomotiva quebrava o silêncio
da tarde ensolarada. De repente, minha avó (que também era beata)
gritou lá do fundo: - Gente, pára o trem, minha Nossa Senhora... Cadê
o Padre Ézio ???? Motivo de pânico quase cômico, avisaram, aos berros,
o maquinista. Ele freou e olhou feio para trás. - O Padre não está
no carro, mas ele veio junto! Onde ele está não sabemos, precisa ver
.... disse uma senhora (uma das beatas da paróquia) lá de trás, quando
foi bruscamente interrompida por uma voz que vinha lá da roça de milho:
- Peraí, gente apressada, venham ajudar aqui, Dio Mio! Era o Padre
Ézio naquele sol quente, com um saco de milho cheio até na boca, tentando
puxar do meio da roça em rumo ao vagão. Quem poderia esperar isso?
Ninguém conseguiu quebrar a surpresa e o silêncio que o ato provocou,
mas um simplório senhor que deveria ter vindo do trabalho de lavrador,
tinha acabado de embarcar em SS, arriscou uma indagação: - Nossa,
padre, não é pecado roubar? Sem constrangimento e com uma calma e
sempre com o riso irônico em seus lábios, o Reverendo retrucou: -
Pecado é roubar e não poder carregar. Venham ajudar aqui logo antes
que a gente perde o trem!" (Luiz Affonso Mendes Junior,
o Ju, Santa Cruz das Palmeiras, 2006).
A estação foi desativada em 1976,
com o fim do ramal.
Santa Silveria estava localizada à beira da estrada asfaltada
que ligava Santa Cruz das Palmeiras à fazenda de Santa Silvéria,
que explorava cana-de-açúcar. Serviu como moradia particular por
muitos anos, e depois passou a ser um depósito da Prefeitura
local.
A estação, em 2015, estava totalmente abandonada.
|
1892
AO LADO: Abre-se o tráfego provisório entre Baguassu e Palmeiras (O Estado de S. Paulo,
6/8/1892). |
|
1895
AO LADO: Muda o chefe da estação para a de Palmeiras (O Estado de S. Paulo,
22/10/1895). |
"Desde princípio de dezembro estou em S. Paulo, onde vim
espairecer um pouco. Segui pela Mogiana até Uberabinha, passei
três dias em Uberaba, quatro em Ribeirão Preto, cinco no Brejão,
com Eduardo Prado, em e meio em Santa Silvéria, com Leão Veloso
(...) Santa Rita do Passa-Quatro, 20-3-1899" |
1899
AO LADO: Em carta a Guilherme Studard,Capistrano de Abreu,
escritor e historiador cearense, relata uma de suas viagens a Santa Rita do Passa-Quatro, em 20/3/1899 (carta a
Guilherme Studard). |
ACIMA: Tristeza e abandono (Foto Suiá Stocco Teixeira, 25/5/2013).
|
TRENS - De acordo com os guias de horários, os trens de passageiros
pararam nesta estação de 1892 a 1976. Na foto
à esquerda, o trem do ramal está em Santa Veridiana.
Clique sobre a foto para ver mais detalhes sobre esses trens.
Veja aqui horários
em 1964 (Guias Levi). |
(Fontes: Ralph Mennucci Giesbrecht: pesquisa
local; Luiz Claudio Vieira Lopes; Luiz Affonso Mendes; Luiz Affonso
Mendes Junior; Suiá Stocco Teixeira; Filemon Peres; Ralph M. Giesbrecht:
Caminho para Santa Veridiana, Editora Cidade, 2003; Cia. Paulista,
álbum de 50 anos, 1918; Cia. Paulista: relatórios anuais,
1872-1969; José Honório Rodrigues: Correspondência de Capistrano de
Abreu, volume 1, Rio de Janeiro, 1954; Mapa - acervo R. M. Giesbrecht) |